James Gunn acerta ao criar algo excêntrico e caótico, mas peca pelos exageros dispensáveis
Por Paulo Costa
É inquestionável que nos dias atuais o cineasta e roteirista James Gunn se destaque por sua ousadia e uma mente perturbadoramente esdruxula, ganhando devida notoriedade após os sucessos "Guardiões da Galaxia Vol. 1 e Vol. 2". Contudo, poucos sabem que sua trajetória cinematografia inclui filmes com mais bizarrices do que vistos nos longas criados para a Marvel Studios, como podemos observar em seu primeiro trabalho como diretor, "Seres Rastejantes" (2006), além de uma parceria de tempos passados com outro cineasta tão louco e criativo quanto ele, Zack Snyder, que trabalharam juntos em começo de carreira no longa "Madrugada dos Mortos" (2004), debute de Snyder na direção a partir de roteiro de Gunn. Agora, os dois voltam a se encontrar em "O Esquadrão Suicida", com James na direção e Zack assumindo a produção ao lado de outros importantes nomes.
No longa que chega aos cinemas nesta quinta-feira, 5 de agosto, temos um time de supervilões que compõe a Força Tarefa X, um grupo formado pelos mais perigosos presos da penitenciária Belle Reve. Recrutados pela imperdoável Amada Waller, eles serão enviados para uma missão suicida na ilha de Corto Maltese, local que esconde perigos capazes de ameaçar a segurança e a estabilidade do mundo todo.
Logo nos primeiros instantes somos arremessados a cenas totalmente insanas e caóticas, cheias de adrenalina, dando um pequeno parecer de que teremos um filme repleto de carnificina, com uma violência gráfica carregada de pedaços de corpos, sangues e muitas vísceras voando para todos os lados. De forma alguma isso é ruim, pelo contrário, só prova o quanto James Gunn é atrevido e corajoso a ponto de colocar em tela tudo aquilo que muitos diretores jamais teriam tamanho atrevimento, tanto que me surpreendi com sua classificação 16 anos, pois tinha toda a certeza que o filme pegaria 18+.
Cena de abertura já apresente todo caos e sanguinolência que teremos no decorrer do filme | Divulgação
O roteiro, sempre que possível, se desvencilha de piadas e situações megalomaníacas, e abre espaço para colocar em pauta temas como relacionamentos familiares, além de críticas politicas e sociais corajosas, até mesmo contra o próprio governo americano e seu povo, assim como algumas alfinetadas a crise ambiental e a destruição de ecossistemas. Infelizmente, parte destas questões apontadas desandam quando nos vemos diante de piadas ruins e de muito mau gosto, bem típicas do "tiozão do pavê ou pacumê?".
Diferentemente de outras obras, sejam elas da Marvel ou da própria DC, com personagens femininas sendo sexualizadas sempre que possível, apelando para roupas curtíssima ou apertadas a vácuo ou então em posições desconfortantes, aqui temos mulheres fodonas, sempre muito bem vestidas e descendo a porrada em macho escroto, além de provar que não precisam de homens para serem salvas e dão conta do recado sozinhas. Desta vez a sexualização recai sobre os personagens masculinos, que são colocados em algumas cenas incomodas para alguns, engraçadas para outros, mas que ainda assim, os tiram de sua zona de conforto e, nas entrelinhas, trabalham uma certa desconstrução do masculino. Digo isso não apenas por serem colocados de roupa intima na grande tela, mas sim, em expor seus mais profundo sentimentos, com direito a um Sanguinário, interpretado com muita elegância por Idris Elba, com medo de ratinhos.
O elenco estelar traz além de Idris como Robert Dubois, mais 5 nomes que já marcaram presença em filmes no MCU: Michael Rooker dando vida ao Sábio, Sean Gunn que participa como Homem-Calendário e também empresta seus movimentos e voz para a Doninha, outro astro que apenas empresta sua voz é Sylvester Stallone como o tubarão Nanaue. David Dastmalchian dá vida ao personagem Abner Krill, mais conhecido como Polka-Dot Man (Bolinha, em português), e entrega uma das mais agradáveis surpresas do filme, com direito a poucas, porém ótimas piadas, carregadas de boas referências. Mas a maior surpresa de todas está na participação mais do que especial de Taika Waititi. Ainda neste time temos Margot Robbie, Joel Kinnaman e Jay Courtney que reprisam seus papeis como Arlequina, Coronel Rick Flag e Capitão Bumerangue, respectivamente. John Cena, que depois de ganhar grande foco como o irmão esquecido de Domic Toretto em "Velozes & Furiosos 9" aparece por aqui como o Pacificador. Além disso, filme marca a estreia da atriz portuguesa Daniela Melchior, como a Caça-Ratos, vale prestar atenção nesta personagem que traz um pouco de doçura e também uma certa dramaticidade ao longa.
Um elenco dos sonhos compõe o time de desajustados em uma missão suicida | Divulgação
Finalmente Amada Waller tem um protagonismo maior. Viola Davis reprisa seu papel, desta vez ainda mais provocativa e mandona, ela entrega uma personagem superior e com muito mais sangue nos olhos, destemida e disposta a não perdoar nenhuma infração e, se for preciso, executando seus recrutados sem o menor remorso. Isso por si só é sensacional, mas ao mesmo tempo extremamente arriscado para um filme como este, que traz consigo uma legião de fãs de seus personagens. A única coisa que posso dizer sem entregar spoilers é: pode ser que nem todos eles cheguem vivos até o final.
E, se depender dos outros "vilões", ninguém sobreviverá mesmo. Com o seu lado mais estrambólico nas alturas, filme apresenta um time de "malvados" com ditadores pirados querendo controlar o mundo. Uma figura estranhíssima conhecida como Pensador, personagem de Peter Capaldi, que entrega uma versão atualizada e apresenta duras criticas aos insanos experimentos que médicos nazistas realizavam durante a Segunda Grande Guerra, bem típico Josef Mengele e suas macabras atrocidades nos campos de concentração em Auschwitz. E não podemos esquecer de Estarro, o Conquistador Estelar, um ser extraterreste em formato de estrela do mar, que bem poderia ser uma versão cruel do Patrick Estrela do desenho "Bob Esponja".
O Brasil marca forte presença com Alice Braga como a guerrilheira Sol Soria que, seja coincidência ou não, luta para reestabelecer a democracia em Corto Maltes, entregando uma realidade que não foge muito do que a que temos vivido. A nossa música também figura em "O Esquadrão Suicida" e complementa a sua trilha sonora com direito a Marcelo D2 com Meu Tambor, e canção Samba na Sola da cantora Céu com . Drik Barbosa conta com um feat. de respeito com ninguém menos que Gloria Groove e Karol Conka com o hit Quem Tem Joga.
Infelizmente, mesmo com toda uma excentricidade que salta aos olhos e aos ouvidos, seja pelas inebriantes sequências de tiro, porrada e bomba, pelos ótimos efeitos especiais, por uma fotografia colorida e radiante, por uma trilha sonora impecável e repleta de diversidades musicais, que sabemos bem que James Gunn escolhe a dedo, ou até mesmo sua mixagem de som que vai do delicado ao estrondoso em segundos, são apenas qualidades técnicas que que beiram a perfeição, mas de forma alguma são capazes de transformar a obra no esperado clássico instantâneo do universo geek.
Arlequina parece uma perdida no rolê, bem oposto de como a personagem de Margot Robbie foi construída e apresentada em "Aves de Rapina", e até mesmo como carregou nas costas o fiasco de 2016. Até o final do segundo ato aqui jaz uma personagem subutilizada, que mesmo com uma ou duas cenas memoráveis, parece ser mantida no time reserva. Trazendo um humor ridiculamente desnecessário, parecendo mais uma abobalhada incumbida apenas de contar piadas ruins, ela ganha destaque e realmente brilha somente no terceiro ato. Se foi uma jogada de Gunn para evitar novamente comentários de que a personagem segurou o filme sozinha, sinto lhe dizer, não foi uma das escolhas mais inteligentes.
Arlequina parece uma perdida no rolê, bem oposto de como a personagem de Margot Robbie foi construída e apresentada em "Aves de Rapina", e até mesmo como carregou nas costas o fiasco de 2016. Até o final do segundo ato aqui jaz uma personagem subutilizada, que mesmo com uma ou duas cenas memoráveis, parece ser mantida no time reserva. Trazendo um humor ridiculamente desnecessário, parecendo mais uma abobalhada incumbida apenas de contar piadas ruins, ela ganha destaque e realmente brilha somente no terceiro ato. Se foi uma jogada de Gunn para evitar novamente comentários de que a personagem segurou o filme sozinha, sinto lhe dizer, não foi uma das escolhas mais inteligentes.
Mesmo não sendo um filme 100%, mas ao mesmo tempo quase que uma esplendorosa obra prima se comparado com o seu terrível antecessor, a sensação que tenho foi a de que toda a liberdade dada a James Gunn, para que fizesse tudo o que lhe viesse a cabeça, o resultado entregue está repleto de exageros, e este é o maior dos pecados cometidos em "O Esquadrão Suicida". O filme precisava de algumas exorbitâncias em toda sua excentricidade? Sim! Mas como diz o ditado "menos é mais", seu diretor poderia ter pesado um pouco menos a mão em algumas piadas desnecessárias que poderiam ser substituídas por momentos realmente hilários, assim como cenas aleatórias que poderiam ter sido retiradas no corte final, já que a duração de quase 2 horas e 20 minutos chega a cansar um pouco, fazendo com que a plateia desanime em determinados momentos. Ainda assim, mesmo com essas derrapadas, não vejo outro nome a não ser o de Gunn para comandar algo tão sem vergonha mas ao mesmo tempo arrojado como este longa. Não espero nada menos do que isso em "Guardiões da Galaxia Vol. 3", segurar esse B.O. Marvel!