Nunca tinha visto um filme de Luis Buñuel antes, o que é uma tremenda falha para um cara que se diz cinéfilo, como eu.
Mas, apesar dessa falha, conheço a obra de Buñuel e já tinho lido algumas coisas sobre sua carreira. Sendo assim, não fui assistir ao filme totalmente às escuras.
Como Buñuel é considerado um mestre do surrealismo, esperava ver um filme “sem pé nem cabeça” (como alguns do Michelangelo Antonioni ou do Peter Greenaway), com situações absurdas e roteiro que não se amarra.
Ainda mais depois de ler a sinopse do filme, em que diz que seis amigos (burgueses, é claro) tentam se reunir para jantar diversas vezes, mas sempre são surpreendidos por alguma situação inusitada.
Porém, o que vejo é um genial e belíssimo filme! Instigante, debochado e engraçado. Com situações absurdas sim, misturando sonhos e devaneios dos personagens com realidade, mas acessível e extremamente bem amarrado. Uma tremenda crítica à arrogância e à falta de escrúpulos não só da burguesia e da elite francesa, mas também da igreja e das ditaduras latino-americanas.
Uma cena (entre várias outras) que registra bem essa crítica: quando os amigos são convidados para jantar na casa de um general do exército e, em determinado momento, são abertas cortinas como se eles estivessem em um palco e são vaiados pelo público.
Merecidamente indicado para os Oscars de melhor filme estrangeiro e melhor roteiro. Ganhou o de filme, mas quem ficou com a estatueta de roteiro “O candidato”, com Robert Redford.
Curiosidades:
- Cinco anos depois de terem sido indicados por “O discreto charme...”, Buñuel e Carriére foram indicados ao mesmo prêmio novamente por “Esse obscuro objeto do desejo”, que também foi indicado a melhor filme estrangeiro.
Perderam para “Julia” (de Fred Zinnemann) e “Madame Rosa” (de Moshé Mizrahi, França) respectivamente.
- O diretor tem 9 filmes no livro “1001 filmes para assistir antes de morrer” (ed. Sextante, R$59,90): além do próprio “O discreto charme...”, estão lá também “Um cão andaluz” (1929), “A idade do ouro” (1930), “Terra sem pão” (1933), “Os esquecidos” (1950), “A adolescente” (1960), “A bela da tarde” (1967) e “Tristana – Uma paixão mórbida” (1970).
Com exceção de “Terra sem pão”, todos os filmes estão disponíveis em DVD no Brasil.
- Buñuel deixou a Espanha, seu país-natal, devido à Guerra Civil. Depois de ter passado um tempo na França e nos EUA, foi para o México, onde se naturalizou mexicano e viveu até sua morte, em 1983. Por ter voltado a trabalhar na Espanha em 1960, seus filmes realizados no México são conhecidos como sendo de sua “fase mexicana”. Seu filme “Viridiana” (dessa fase) ganhou a Palma de Ouro em Cannes em 1961.
- Ninguém mais ninguém menos do que Alfred Hitchcock o escolheu como o melhor diretor de todos os tempos.
- O espanhol Fernando Rey e a francesa Stephane Audran são muito famosos não somente na Europa mas também em Hollywood.
Rey esteve em “Operação França” (ganhador do Oscar de melhor filme de 1971) e “1492 – A conquista do paraíso” (1992, de Ridley Scott). Já Audran esteve em “Agonia e glória” (1981, de Samuel Fuller) e “Risco máximo” (1996, com Jean Claude Van Damme), além do dinamarquês ganhador do Oscar de filme estrangeiro de 1987 “A festa de Babette”.
Imagens e vídeos: Divulgação
É interessante pensar em como eu “caí do cavalo” ao ver esta obra-prima que é “O discreto charme da burguesia”.